25.09.2024 Ícone da categoria

As muitas faces de Donald Glover

Donald Glover vem transitando nas mais diversas áreas, desde a música com Childish Gambino até produções icônicas como Atlanta. Conheça tudo sobre a sua carreira.

As muitas faces de Donald Glover

Donald Glover é um fenômeno criativo que transcende qualquer classificação simples. Nascido em 25 de setembro de 1983, na Base Aérea de Edwards, na Califórnia, ele cresceu em uma família de Testemunhas de Jeová, uma fé que moldou sua infância de forma disciplinada e rígida. Mesmo com as limitações impostas pela religião, o jovem Donald encontrou maneiras de absorver a cultura pop à sua volta, ainda que em segredo. Era comum vê-lo assistindo escondido programas como Os Simpsons, que instigaram seu senso de humor e deram os primeiros sinais da veia cômica que iria marcar sua carreira futura. No entanto, as artes não eram parte central de sua criação; ele encontrou sozinho sua rota criativa.

Mudando-se para a Geórgia ainda jovem, Glover se destacou na Escola de Artes de DeKalb, onde descobriu sua paixão pela escrita e atuação. Mas, como em muitas de suas fases iniciais, ele lutava para se adaptar. Na faculdade, foi aceito na Tisch School of the Arts, da Universidade de Nova York, um dos mais renomados centros de formação artística nos Estados Unidos. Lá, ele estudou dramaturgia e começou a trilhar o caminho que o levaria a se tornar um dos criadores mais inovadores da indústria do entretenimento.

Durante seus anos universitários, Glover formou o grupo Derek Comedy com colegas, onde começou a criar esquetes cômicas que rapidamente ganharam popularidade online. O sucesso desse grupo cômico chamou a atenção de ninguém menos que Tina Fey, que o contratou, aos 23 anos, para fazer parte da equipe de roteiristas da série 30 Rock, da NBC. Fey reconheceu seu talento, mas também o contexto racial de sua contratação, admitindo que a iniciativa de diversidade da emissora facilitou sua entrada na equipe. No entanto, independentemente dos motivos, Glover rapidamente se destacou no programa, contribuindo com roteiros que lhe renderam prêmios Emmy ao lado de seus colegas.

Mesmo escrevendo para um dos programas mais bem-sucedidos da TV, Donald Glover sempre quis estar à frente das câmeras. Em 2009, ele conseguiu sua grande chance quando foi escalado para o papel de Troy Barnes na sitcom Community, uma das produções mais queridas da época. Glover trouxe uma energia única ao personagem, tornando-se rapidamente um favorito dos fãs graças à sua química com o elenco, especialmente com Danny Pudi, que interpretava Abed. Em Community, ele pôde explorar não só seu talento para comédia física, mas também sua habilidade de improvisação, que viria a ser uma de suas marcas registradas. No entanto, seu tempo na série foi relativamente curto; ele deixou o show após a quinta temporada, em 2014, para se dedicar completamente a seus outros interesses artísticos.

Community é série que reúne um grande número de fãs, torcendo para o anunciado filme.

Enquanto sua carreira de ator e roteirista decolava, Donald Glover também estava silenciosamente construindo outro aspecto fundamental de sua identidade artística: a música. Sob o pseudônimo Childish Gambino — nome que ele obteve de um gerador de nomes do Wu-Tang Clan —, Glover começou a lançar mixtapes e, eventualmente, seu primeiro álbum de estúdio, Camp, em 2011. O disco foi uma surpresa para muitos, especialmente para aqueles que o conheciam principalmente como um comediante. O álbum, que combinava letras introspectivas com um estilo irreverente, foi bem recebido por críticos e começou a construir uma base de fãs leais para Gambino.

Mesmo assim, Glover nunca se viu como um “rapper” no sentido tradicional. Ele frequentemente mencionava que sua verdadeira paixão não era a música em si, mas a criação de mundos—uma obsessão que se tornaria mais evidente em seus projetos futuros. Em uma entrevista, ele comentou: “Eu só quero criar mundos. Não estou interessado em fazer álbuns, não mais.” Essa mentalidade permeou sua obra seguinte, o ambicioso Because the Internet (2013), que transcendeu as fronteiras da música e entrou no território da narrativa multimídia. O álbum veio acompanhado de um roteiro de 72 páginas, que deveria ser lido enquanto se ouvia as faixas, e de um curta-metragem que funcionava como um prelúdio. Glover estava usando a música como um meio para contar uma história muito maior, algo que ele já visualizava desde o início de sua carreira.

Para Glover, Because the Internet era mais que um álbum. Era uma tentativa de redefinir o que a música podia ser, aproximando-a de um conceito quase cinematográfico, com trilhas sonoras que acompanhavam uma narrativa complexa. O álbum trazia hits como “3005” e “Sweatpants”, mas o impacto foi muito além das paradas musicais. A estrutura multimídia e o conceito de mundo interconectado que Glover introduziu no projeto consolidaram sua reputação como um inovador artístico, alguém que não estava interessado em se limitar a rótulos ou fórmulas pré-estabelecidas. Ele rejeitava as expectativas que as pessoas colocavam sobre ele, especialmente aquelas relacionadas ao que significava ser um rapper ou um músico negro no mainstream. “Não sou um rapper. Nem me considero no jogo do rap.” disse em várias entrevistas.

Mas foi em 2016 que Childish Gambino fez sua virada mais radical até então. Com o lançamento de Awaken, My Love!, Glover abandonou completamente o rap em favor de um som que abraçava o funk, o soul psicodélico e o R&B, claramente inspirado em artistas como George Clinton e Prince. A faixa “Redbone”, uma fusão perfeita desses gêneros, se tornou um fenômeno, amplificada ainda mais por sua inclusão no filme Corra! (Get Out), de Jordan Peele. O álbum foi aclamado pela crítica e marcou um ponto de inflexão na carreira de Glover, provando que ele era um artista capaz de se reinventar completamente e surpreender seu público a cada novo projeto.

A elogiadíssima performance ao vivo no programa de Jimmy Fallon

Esse espírito de reinvenção também ficou evidente em sua incursão na televisão. Ao criar, escrever, dirigir e estrelar a série Atlanta, Donald Glover deu um passo além em sua busca por criar mundos únicos e contar histórias complexas e não convencionais. A série, que estreou na FX em 2016, foi uma revolução no gênero de comédia dramática, trazendo uma abordagem surrealista e frequentemente absurda para a experiência negra nos Estados Unidos. Glover descreveu Atlanta como “uma série punk”, algo que ele usava para desafiar as convenções da televisão tradicional. A primeira temporada foi um sucesso absoluto, recebendo dois Globos de Ouro e dois Emmys, enquanto a crítica aclamava sua originalidade e profundidade emocional. A série misturava drama com toques de realismo mágico, muitas vezes borrando as linhas entre o que é real e o que é imaginado, refletindo as tensões raciais e sociais da América contemporânea.

Ao longo da série, Glover explorou temas como a luta pela fama, as disparidades econômicas e o trauma da vivência negra na América. Com episódios icônicos como “B.A.N.”—uma sátira brilhante da Black Entertainment Television (BET)—e “Teddy Perkins”, que se destacou como um dos capítulos mais perturbadores e surrealistas da TV moderna, Atlanta firmou-se como uma das séries mais importantes da década. Glover mais uma vez provou que não estava interessado em contar histórias tradicionais; ele queria desconstruir o próprio formato televisivo e as expectativas do público. E ele fez isso com maestria.

Em paralelo à sua ascensão no mundo da televisão, Glover também estava fazendo grandes incursões no cinema. Em 2018, ele interpretou Lando Calrissian em Solo: A Star Wars Story, um papel icônico que ele tornou seu com um carisma inconfundível. No mesmo ano, ele também assumiu o papel de Simba no remake live-action de O Rei Leão (2019), ampliando ainda mais sua presença em Hollywood. Esses papéis consolidaram Glover como uma das figuras mais influentes e procuradas da indústria, tanto em frente quanto atrás das câmeras.

Um review pra entender por que Atlanta é tão genial.

Apesar de seu sucesso avassalador em várias mídias, foi com o lançamento de This Is America que Donald Glover, como Childish Gambino, conseguiu talvez seu maior impacto cultural. O videoclipe, lançado em 2018, foi uma crítica feroz à violência armada, ao racismo e à brutalidade policial nos Estados Unidos. Com uma coreografia marcante e símbolos poderosos—como o ato de atirar em um coral de igreja—, This Is America provocou um debate massivo sobre as condições sociais da época. O vídeo foi assistido e discutido milhões de vezes, sendo decomposto em análises quadro a quadro, à medida que o público buscava entender todas as camadas de significado presentes na obra. A música estreou em primeiro lugar na Billboard Hot 100, recebeu quatro Grammys e se tornou um dos marcos artísticos da década, provando que Glover, através de Childish Gambino, havia atingido o auge de sua influência cultural.

No entanto, Glover nunca quis ser definido por apenas um sucesso. Para ele, o ato criativo é fluido, e as personas que ele assume são temporárias. “Eu sempre pensei no Gambino como uma metáfora para alguém que cresce, como uma criança que se torna um chefe.” Com essa filosofia em mente, ele anunciou que seu mais recente álbum, Bando Stone in the New World, seria o último sob o nome de Childish Gambino. Este álbum é a trilha sonora de seu filme homônimo, e encerra a trajetória de Gambino como uma entidade criativa independente. Para Glover, encerrar esse capítulo não é o fim de sua exploração musical, mas um convite para se aventurar em novas fronteiras criativas.



Ao longo de sua carreira, Donald Glover foi uma força motriz por trás da evolução da música, televisão e cinema. Ele não apenas criou obras de arte inovadoras, mas também desafiou os limites do que significa ser um artista negro na América moderna. Seja como roteirista em 30 Rock, ator em Community, criador de Atlanta ou músico sob o nome de Childish Gambino, Glover continua a redefinir o que é possível em cada meio que toca. Sua capacidade de se reinventar, de evitar rótulos e de seguir sua curiosidade criativa o colocou em um patamar que poucos artistas conseguem alcançar. Como ele próprio disse: “Eu só queria contar histórias. No final do dia, tudo isso realmente é sobre histórias.” E, sem dúvida, Donald Glover continuará a contar histórias que moldam o mundo ao seu redor—seja qual for a forma que essas histórias tomem.

Donald Glover: ator, roteirista, diretor, produtor & músico

Atuando, escrevendo, dirigindo e produzindo, ele transita por diversos gêneros, trazendo uma abordagem única e autêntica a cada projeto.


Atlanta (2016-2022)
Atlanta é uma de suas obras mais emblemáticas. Glover criou, estrelou, escreveu e ocasionalmente dirigiu a série, que mistura drama, comédia e surrealismo para explorar a vida de dois primos navegando na cena do rap de Atlanta. A série aborda temas como raça, identidade e o “sonho americano”, conquistando prêmios como Globos de Ouro e Emmys.


Homem-Aranha: Através do Aranhaverso (Spider-Man: Across the Spider-Verse) (2023)
Donald Glover aparece em uma participação especial neste filme de animação aclamado, expandindo sua conexão com o universo do Homem-Aranha, após já ter interpretado Aaron Davis no filme Homem-Aranha: De Volta ao Lar.


Sr. e Sra. Smith (Mr. and Mrs. Smith) (2024)
Nesta adaptação da série clássica de ação, Glover atua como showrunner e também interpreta o papel principal ao lado de Maya Erskine. A série reimagina o conceito original com uma abordagem moderna, misturando ação e humor, com a marca criativa de Glover.


Enxame (Swarm) (2023)
Glover é um dos criadores e produtores desta série dramática, que explora a obsessão de uma jovem fã com sua estrela pop favorita, levando-a por uma trilha sombria. A série aborda temas de fandom, cultura pop e os limites da idolatria.


Han Solo: Uma História Star Wars (Solo: A Star Wars Story) (2018)
Como Lando Calrissian, Glover trouxe charme e profundidade a um dos personagens mais queridos de Star Wars. Sua performance foi amplamente elogiada e gerou especulações sobre uma possível série derivada centrada em Lando.


O Rei Leão (The Lion King) (2019)
Glover dublou Simba na versão live-action do clássico da Disney. Ele capturou a evolução emocional do personagem, desde seu exílio até o retorno como o verdadeiro rei da savana, ao lado de grandes nomes como Beyoncé.


Guava Island (2019)
Este curta-metragem musical, estrelado por Donald Glover e Rihanna, é uma mistura de política, arte e música. Glover interpreta Deni, um músico que sonha em realizar um festival para sua comunidade, enfrentando desafios impostos por um líder local.


Because the Internet (2013)
Glover, sob o nome Childish Gambino, lançou este álbum inovador que vai além da música, acompanhado de um roteiro de 72 páginas e um curta-metragem (Clapping for the Wrong Reasons). O álbum explora o impacto da internet na cultura e nas relações humanas, sendo um marco em sua carreira musical e criativa.


This Is America (2018)
Mais do que uma música, This Is America foi um fenômeno cultural. O clipe, cheio de simbolismos e críticas sociais, abordou temas como violência armada, racismo e desigualdade nos Estados Unidos, gerando debates intensos em todo o mundo. O trabalho rendeu a Glover prêmios Grammy e consolidou seu lugar como um dos artistas mais impactantes da atualidade.