Estética e arte na comida: uma perspectiva afrocentrada.

Em sua coluna, a chef Aline Chermoula questiona: qual o nosso olhar para as comidas africanas? O quanto conhecemos delas? E o quanto reconhecemos que ela também nos pertence? 

Estética e arte na comida: uma perspectiva afrocentrada.

Já pensou como o aspecto visual de um prato de comida pode despertar os seus sentidos e proporcionar uma variedade de sensações?

Há comidas que nos encantam não somente por sua aparência, a sedução vai bem além do que os olhos podem enxergar. A magia pode estar no aroma maravilhoso que  a comida exala, a partir da combinação e mistura perfeita de ingredientes, nos detalhes da confecção do prato, na história que ele carrega em si. 

É fato que  o ato de comer vai muito além da simples ingestão da comida, a escolha de um prato como alimento é feita, a partir de nossa identidade cultural, do contexto social e econômico, da religião, da geografia, da etnia, ecologia e as diversas práticas sociais. Nossos gostos são formados a partir do contexto social que vivemos, somos ensinados a gostar de determinados alimentos e de apreciá-los
visualmente a partir da sua estética e da representação daquela cultura. Diante disso, é perceptível que essa construção ideológica da comida também nos remete a visualizar o lugar social daqueles que consomem determinados alimentos.

Sabemos a origem de alguns dos alimentos que consumimos cotidianamente no Brasil. A Diáspora Africana influenciou diretamente a forma de pensar, sentir, falar e de se alimentar em vários lugares do mundo, alem de nós que temos a maior população negra fora da África. 

Nossas comidas também valorizam a estética múltipla, não seguindo o padrão vigente no mundo gastronômico contemporâneo, pois se relacionam diretamente com diversos aspectos culturais como forma de representatividade. Um exemplo são comidas de santos, que reconhecem a importância da sabedoria milenar transmitida oralmente e abrange a cultura alimentar dos diferentes grupos étnicos africanos que marcaram a formação do Brasil com a introdução de alimentos e adaptações de ingredientes, receitas que recuperam e acionam sua memória social, afetiva e religiosa. 

Uma comida que reverencia os ingredientes: eles são os protagonistas que nos levam a um intercâmbio cultural e gastronômico pelo Continente africano. 
 
E qual é nosso olhar para as comidas africanas? O quanto conhecemos delas? E o quanto reconhecemos que ela também nos pertence? 

Cá entre nós, não é nenhuma novidade que grande parte dos elementos culturais, africanos e afro brasileiros não são apresentados como portadores de complexidade, de técnica, beleza estética e valor. Para mudar esta realidade precisamos nos lançar numa imersão.

A partir da foto acima  podemos perceber como a culinária africana pode despertar sensações, acionar nossas memórias afetivas e nos instigar a saborear pratos que estão presentes no cotidiano de outros
grupos étnicos. 

Então percebemos que para apreciar as comidas africanas e afrodiaspóricas é preciso conhecer e compreender os diversos aspecto que envolvem de forma abrangente as culturas ancestrais e contemporâneas de seus povos. Exige expansão no olhar e uma certa dose de empatia para aceitar o
outro e ver beleza no diferente. 

Por fim, encerro com três indicações, para que tenham uma experiência ampla, complexa e completa, sobre gastronomias e culturas africanas, afrodiaspóricas: o restaurante Altar Cozinha Ancestral, em São Paulo, da chef Carmem Virgínia; a minissérie Da África aos EUA: Uma jornada gastronômica e o documentário Sankofa: A África Que Te Habita, ambos disponíveis na plataforma Netflix.