O hype da diversidade acabou?

Menos investimento, mais retrocesso: o impacto real do backlash na economia negra.

O hype da diversidade acabou? Foto: Cottonbro Studio

Em uma década, a desigualdade racial persiste no mercado de trabalho. É o que mostra um estudo inédito feito pela Ceda (Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais) com dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua). 

Trago o destaque para dois dados do levantamento: Entre 2012 e 2023, as pessoas brancas empregadoras eram o dobro das pessoas negras. Além disso, apenas 33% das pessoas negras estavam em cargos gerenciais durante o período analisado, em um país onde cerca de 56% da população é negra.

Se a população negra é uma maioria minorizada no mercado de trabalho, como podemos acessar recursos para o sustento, criação de negócios e movimentação econômica?

O panorama brasileiro se torna ainda mais preocupante diante do cenário global. Com a volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, diversas empresas congelaram os investimentos em programas e políticas de diversidade, questões ambientais e ESG, entre elas: Meta, McDonalds, Walmart, Starbucks, Amazon, Google, e até mesmo universidades. 

Foto: Lara Jameson

Esse movimento, conhecido como Backlash, descreve o retrocesso de pautas como diversidade e sustentabilidade ambiental e empresarial, impulsionada por um conversadorismo anti-woke, ou seja, anti progressos que defendem a conscientização social e racial, e a luta contra injustiças.

Os desdobramentos já afetam os negócios do Brasil. O Festival Feira Preta, realizado todos os anos desde 2002, anunciou que adiará a edição de 2025 por falta de patrocínio. A edição de 2024, que ocorreu no Parque Ibirapuera, movimentou cerca de R$14 milhões, beneficiou 170 empreendedores negros e gerou mais de 600 empregos. Isso significa mais do que cifras. É recurso injetado na economia, no turismo e no bolso de pessoas negras. É mais do que muitas políticas públicas que já foram implementadas no país, e que precisam e devem existir, mas seguem ineficientes, de acordo com os dados divulgados pela Cedra.

O adiamento de um evento com a dimensão da Feira Preta acarreta em prejuízo direto na economia criativa do estado e do país, sobretudo de profissionais negros. Outros festivais pretos passam pelos mesmos desagios, como por exemplo a Batekoo.



Segundo comunicado da Feira Preta, além da redução dos patrocínios, a burocracia interna das grandes empresas têm dificultado a liberação de recursos, tornando o processo de captação mais complexo e demorado.

Esse é o exemplo concreto de como o racismo se expressa no mercado. Falta de oportunidade, burocracia sem sentido, taxação excessiva de quem recebe menos e desoneração dos mais ricos, entre outros exemplos.

O resulto é apenas um: são centenas de pessoas que deixam de receber por falta de investimento de empresas que poderiam continuar a injetar recursos, mas viram as costas porque aparentemente a diversidade está caindo em desuso e Michael Jackson estava certo: “They Don’t Really Care About Us”.