Eu sempre gosto de falar sobre a importância de citar pessoas negras em diferentes áreas do conhecimento. Para que a diversidade seja real, é necessário que a sociedade se acostume com pessoas negras, indígenas, LGBTQIAPN+, entre outras pluralidades, em distintas áreas; indo além das caixinhas.
Por isso, o texto de hoje é para citar pessoas indígenas que estão reinventando o Brasil em diferentes áreas: na política, na tecnologia, na literatura. São pessoas notáveis por seus talentos e saberes, que se potencializam com suas identidades.
Pelos dados oficiais, os povos indígenas do Brasil representam cerca de 2 milhões de pessoas, mas sabemos que esse número pode ser subnotificado por falta de conhecimento da população sobre suas próprias raízes. No entanto, é importante frisar que a presença na universidade e no universo acadêmico está crescendo exponencialmente: em 2021, mais de 46 mil indígenas estavam matriculados em cursos superiores, um aumento de quase 374% em relação a 2011.
Na indústria criativa, no campo da política e na ciência, as lideranças indígenas vêm mostrando que seus conhecimentos não são apenas parte da tradição: são motores de inovação e transformação social.
A seguir, destaco nove personalidades que personificam esse entrelaçamento entre conhecimento ancestral e criatividade.
1. Sônia Guajajara (Política)
Ministra dos Povos Indígenas e liderança do povo Guajajara, Sônia tornou-se símbolo da potência indígena no espaço político. Sua presença no governo federal não apenas amplia a representação indígena, mas também tensiona velhas estruturas, trazendo novas pautas ligadas à sustentabilidade, aos direitos territoriais e à pluralidade cultural. Ela é um exemplo de como a política pode ser reinventada a partir de um lugar de ancestralidade e de futuro.

2. Davi Kopenawa Yanomami (Literatura)
Davi Kopenawa é autor de A Queda do Céu, obra fundamental que articula cosmologia indígena, ciência ambiental e denúncia política. Seu trabalho pela preservação do território Yanomami é também uma luta pela vida e pela ciência da floresta, onde o conhecimento tradicional se entrelaça com a ecologia e a antropologia contemporâneas.
3. Jaider Esbell (Arte)
Artista, curador e escritor do povo Macuxi, Jaider Esbell já se encantou, como dizem nas cosmologias indígenas. Esbell foi um dos grandes responsáveis por abrir caminhos para a arte indígena contemporânea no Brasil e no mundo. Sua participação na Bienal de São Paulo e sua atuação como curador no movimento de arte indígena foram decisivas para que se rompesse a ideia de arte como algo apartado da vida e da ancestralidade. Sua criatividade mostrou que a estética indígena é também política e ciência cultural.
4. Sandra Benites (Ativismo)
Primeira mulher indígena a integrar uma equipe curatorial no Museu de Arte de São Paulo (MASP), Sandra Benites, do povo Guarani Nhandeva, é antropóloga e educadora. Sua trajetória desafia as estruturas coloniais do conhecimento, abrindo caminhos para que os saberes indígenas ocupem espaços institucionais de poder e legitimidade. Sua atuação é ao mesmo tempo política, científica e profundamente criativa.

5. Áua Mendes (Arte visual)
Jovem liderança do povo Tukano, Áua Mendes é referência na intersecção entre juventude indígena, artes visuais e inovação cultural. Ao longo dos anos, a artista já participou de diversos festivais de grafite em São Paulo, Paraná, Manaus, Minas Gerais e Amazonas, além de desenvolver projetos com diversas marcas como Converse BR, Natura, Sesc, Hershey’s, Google Brasil, Nike, Top Trends, Nubank, Feira Preta, Tomie Ohtake, PerifaCON, Vivo e MAM.
Essa relação de Áua com a publicidade é um caminho que precisa ser mais estreitado, pois ela representa como as novas gerações indígenas estão criando linguagens próprias para dialogar com o mundo contemporâneo, sem abrir mão da ancestralidade.
6. Sioduhi Paulino de Lima (Inovação)
Do povo Kokama, o cientista indígena Sioduhi Paulino de Lima é um dos criadores do ManioColor, um corante natural extraído da casca da mandioca. A inovação alia sustentabilidade, ciência e cultura alimentar tradicional, oferecendo uma alternativa à indústria de corantes artificiais. Sua pesquisa mostra como a bioeconomia pode ser um campo fértil de inovação científica com base em saberes indígenas.
7. Joeliton Vargas Moraes (Tecnologia)
Indígena Pataxó, Joeliton Vargas Moraes é o criador do IKABEN, plataforma que utiliza blockchain para rastrear e valorizar grafismos indígenas. A iniciativa inova ao garantir a autoria e a proteção da arte, revertendo benefícios diretamente para as comunidades. Joeliton representa uma nova geração que conecta tecnologia de ponta à preservação cultural e à economia criativa indígena.
8. Glicéria Tupinambá (Arte)
Artista, educadora e liderança do povo Tupinambá, Glicéria Tupinambá tem sido fundamental no processo de recuperação e valorização cultural por meio da recriação dos mantos Tupinambá, vestimentas sagradas feitas de penas, usadas por lideranças antes da colonização. Após conhecer um desses mantos em um museu da França, Glicéria iniciou uma jornada de reivindicação da devolução desses artefatos e de resgate do conhecimento ancestral, recriando-os e reafirmando a espiritualidade e o pertencimento do seu povo.
9. Ailton Krenak (Filosofia)
Ailton Krenak, escritor, filósofo e ativista do povo Krenak, é um dos maiores pensadores do Brasil contemporâneo. Em outubro de 2023, foi eleito o primeiro indígena a integrar a Academia Brasileira de Letras (ABL), tomando posse em abril de 2024. Seus livros, como Ideias para adiar o fim do mundo, convidam a humanidade a repensar a relação com a Terra e com a vida. Sua obra vai além da política tradicional e se projeta como um manifesto de criatividade existencial, que une literatura, filosofia e ecologia.
Dica bônus
Desde 23 de agosto é possível visitar uma das maiores exposições indígenas que já passou pelo Brasil. Com mais de 250 obras, de 54 artistas de norte a sul do país, a exposição Insurgências Indígenas acontece no Sesc Quitandinha, em Petrópolis (RJ). Entre os destaques, a mostra traz um manto Tupinambá de Glicéria Tupinambá.