Criatividade e inovação: iniciativas negras são urgentes

A criatividade negra é força motora da inovação e precisa ocupar com protagonismo o mercado da comunicação.

Criatividade e inovação: iniciativas negras são urgentes Imagem gerada por AI: ChatGPT

Em qualquer espaço relacionado ao mercado da comunicação e da publicidade, é provável que você se depare com os conceitos de criatividade e inovação. Desde os primórdios da profissão, ser criativo/a e inovador/a são habilidades supervalorizadas. Afinal de contas, produzir textos, campanhas, ativações, jingles, entre outras atividades, exige esses talentos. Não à toa, o lema clichê do mercado é: “pensar fora da caixa”.

É dessa maneira que a criatividade passou a ser vista como uma suposta genialidade inata do profissional e largamente atrelada às grandes agências. Em um cenário onde pessoas brancas correspondem a mais de 65% dos funcionários das agências de publicidade, segundo o Censo de Diversidade das Agências Brasileiras de 2023, fica o questionamento: historicamente, qual é a cor da criatividade e inovação na comunicação e publicidade brasileira?

Um grande teórico da comunicação e da cultura, o sociólogo britânico-jamaicano Stuart Hall, falecido em 2014, defendia que a criatividade não é algo individual, mas sim uma habilidade que emerge das interações sociais, trocas culturais e da ressignificação de símbolos. A inovação sempre foi impulsionada pela diversidade de vivências e de referências. No entanto, por séculos, o mercado criativo operou dentro de uma bolha homogênea que, além de limitar a representatividade, restringiu possibilidades reais de revolução cultural e econômica. É por isso que hoje, mais do que nunca, é necessário se voltar para as iniciativas negras deste mercado.

Stuart Hall, sociólogo britânico-jamaicano, falecido em 2014, defendia que defende que a criatividade não é algo individual

Já somos vanguarda

Na obra “Ensinando a Transgredir”, bell hooks discute a criatividade como um ato de resistência e transformação. Não é possível criar e inovar sem abalar as estruturas vigentes — e isso as pessoas negras sempre souberam como realizar.

É a tecnologia ancestral presente no acarajé das baianas, cujo valor da venda era revertido em fundos para comprar alforria. É a genialidade das tranças nagô, que, para muito além da estética, eram feitas por mulheres escravizadas para transformar o penteado em mapas com rotas de saída e pontos de encontro. Com suas cabeças criptografadas, mulheres negras comunicavam aos outros qual era a estratégia de fuga.

A criatividade emerge da cultura negra em todos os tempos. Na música, o jazz, o funk, o reggae, o samba, o axé e tantos outros estilos musicais essenciais para a cultura são de origem negra. Na dança, a capoeira, o jongo, o breakdance, o hip hop estão nas bases de diversas manifestações. Na arte e na moda, a street art e o street wear ditam tendência há séculos. A gastronomia mundial — e sobretudo a brasileira — é largamente negra.

Escritora, professora, teórica feminista, artista e ativista antirracista estadunidense,bell hooks

Todo mundo sabe disso, mas é importante reforçar e trazer para a lógica do mercado. Se os negros produzem, por que não lucram? É necessário liderar as iniciativas e tomar a frente dos processos. No mercado da criatividade e da inovação também.

Caminhos de inspiração

No Brasil, mais de 55% da população é negra (preta ou parda). As pessoas negras correspondem a um mercado consumidor imenso, responsável por injetar cerca de R$ 1,7 trilhão na economia, de acordo com dados do Movimento Black Money. Ou seja, o consumo negro supera o consumo da classe A, composta majoritariamente por pessoas brancas.

Uma comunicação e publicidade que de fato dialogue com o mercado consumidor negro é fundamental para gerar engajamento, pertencimento com a marca, geração de valor e vendas.

Nesta leva, existem diversas agências que admiro e servem de inspiração. Co-fundada por Clariza Rosa, a Produtora SILVA é uma agência de comunicação e produtora de imagem especializada em criatividade brasileira. Seu próprio nome, “Silva”, já dá o tom para a comunicação da agência, que é voltada para a valorização da cultura cotidiana brasileira, cheia de símbolos e características únicas e marcantes. Com essa visão, a SILVA busca romper a distância social de pessoas negras e periféricas do mercado publicitário e propõe novas técnicas que fogem do modelo tradicional, levando em consideração contextos socioculturais, movimentos e expressões em imagem.



É impossível não citar a Gana, agência fundada por Ary Nogueira e Felipe Silva. Composta exclusivamente por profissionais negros, a Gana tem um olhar muito precioso para a criatividade, que transforma as vivências e experiências das pessoas negras e periféricas. Estive lado a lado com eles no projeto “Mano a Mano”, podcast original do Spotify apresentado por Mano Brown, que tem direção criativa da Gana e produção da MugShot, Boogie Naipe e Spotify Studios.

Para concluir, preciso reforçar a importância dos creators negros. De acordo com a pesquisa “Creators & Negócios 2022”, realizada pela YOUPIX em parceria com a Brunch, existem disparidades raciais significativas nessa área: 11,1% dos creators brancos declararam ganhos acima de R$ 20 mil, enquanto apenas 6,2% dos creators não brancos atingiram essa faixa de renda. Ou seja, é hora das marcas e empresas olharem com mais atenção para esses profissionais negros. A Black Influence acaba desempenhando esse papel e realizando a ponte entre mercado e creators pretos.

Ricardo Silvestre, CEO da Black Influence.

Sob a liderança de Ricardo Silvestre, a Black Influence é a principal agência da América Latina especializada em influência e comunicação antirracista. Com perfil multidisciplinar, a agência conecta marcas a comunidades diversas por meio de creators e influenciadores, tornando-se referência em comunicação criativa e representatividade na indústria publicitária brasileira. É um trabalho fundamental para levar representatividade e diversidade para o mercado da influência, que cresce em ritmo acelerado.